Direito da propriedade industrial: o registro da marca do clube empresa 
di Joseph Robert Terrell[1]

 

RESUMO

 “Marca são os sinais distintivos visualmente perceptíveis, não compreendidos nas proibições legais”, sendo “suscetíveis de registro como marca os sinais distintivos visualmente perceptíveis, não compreendidos nas proibições legais”. Em relação aos clubes desportivos, marca e nome empresarial se confundem; de tal forma que a marca em sua totalidade é o nome dos próprios clubes. Com o advento da “Lei Pelé”, tornou-se necessário os clubes desportivos se constituírem em sociedades comerciais. Sabemos que estes clubes comercializam produtos com seus nomes impressos neles. Por isso se fez obrigatório o registro da marca junto ao INPI. Porém, a “Lei Pelé” desobriga as federações e os clubes a efetuarem tal registro.

 

PALAVRAS-CHAVES

 Marca. Marca de Alto Renome. Marca Notoriamente Reconhecida. Lei nº 9.279/96. Clube Empresa. Lei nº 9.615/98. Lei Pelé. Medida Provisória nº 39.

 

ABSTRACT

 “Marks are the distinctive signs visually perceptible, not understood in the legal restrictions”, being “subject to registration as mark, the distinctive and visually perceptible signs, not understood in legal prohibition”. Regarding the athletic clubs, mark and company names get mixed up in such way that a mark in its entirety, is the name of the club. With the arrival of the “Pelé Law” it was necessary that athletic clubs become a commercial partnership. We know that these clubs commercialize products with their name brands printed on them. For this reason it became compulsory the registration of name brands at INPI. The “Pelé Law” exempts the federations and the clubs from effecting such registration.

 

              KEY WORDS

Mark. Mark Name of High Profile. Mark Notorized by a Public Notory. Law nº 9.279/96. Enterprise Club. Law nº 9.615/98. Pelé Law. Temporary Law nº 39.

 

 INTRODUÇÃO

  

O presente artigo visa esclarecer, de forma direta e específica, as controvérsias existentes em relação à necessidade de registrar, ou não, a marca do clube empresa.
Iniciando-se pelo instituto da marca, ante a legislação nacional vigente, acercando temas como sua definição, os princípios que a regem, alguns tipos de marca, em especial as marcas de alto renome e as marca notoriamente reconhecidas.

A posteriori discorreremos sobre o clube empresa, uma nova forma empresarial; onde uma associação que visa o esporte e a parte social tem de se adequar à inovação legal, devida a necessidade em aumentar o profissionalismo nestas entidades. Neste item abordaremos com maior profundidade a marca do clube empresa, a qual gera boa parte da receita das entidades de prática desportiva.

  

1.     DA MARCA

 

Primeiramente, devemos definir e conceituar o que vem a ser marca.

Segundo DOUGLAS GABRIEL DOMINGUES[2], a Lei nº 5772, de 21 de dezembro de 1971, que institui o Código de Propriedade Industrial e dá outras providências[3] definiu a marca da seguinte forma: 

“Marca é o sinal distintivo que identifica e distingue mercadorias, produtos e serviços de outros idênticos ou assemelhados”. 

Porém, em 14 de maio de 1996, com a elaboração da Lei nº 9.279[4], que regula direitos e obrigações relativos à propriedade industrial, a definição legal de marca foi modificada; a qual vigora até hoje. De tal modo, conforme o disposto no artigo 122 da referida Lei: 

“Marca são os sinais distintivos visualmente perceptíveis, não compreendidos nas proibições legais”. 

Com a definição elaborada pelo legislador, podemos concluir que marca, segundo a lei brasileira, é um elemento fantasia, constituindo-se em um sinal distintivo que seja visualmente perceptível, e que tem como finalidade identificar e distinguir produtos e serviços de outros análogos, de procedência diversa, bem como certifica a conformidade dos mesmos com determinadas normas ou especificações técnicas[5].
Alguns autores têm outros conceitos, como veremos a seguir: Para FRAN MARTINS
[6] “chamam-se marcas de indústria, de comércio ou de serviço os nomes, palavras, denominações, monogramas, emblemas, símbolos, figuras e quaisquer outros sinais usados como o fim de distinguir mercadorias, produtos industriais ou serviços de outros semelhantes”. Já para HUMBERTO PIRAGIBE MAGALHÃES[7] marca é “sinal distintivo dos produtos industriais e artigos de comércio em geral, aposto aos mesmos para que o público e os demais interessados possam identificá-los e distingui-los sem possibilidades de confundi-los com outros da mesma espécie, ainda que semelhantes”.  Ao passo que NEWTON SILVEIRA[8] considera que “todo nome ou sinal hábil para ser aposto a uma mercadoria ou produto ou a indicar determinada prestação de serviços e estabelecer entre o consumidor ou usuário e a mercadoria, produto ou serviço uma identificação constitui marca”.

Desse modo, sendo a marca um sinal distintivo, visualmente perceptível, que identifica e distingue produtos e serviços de outros análogos, de procedência diversa, é obvio que não pode haver mais de um produto idêntico ou assemelhado com a mesma marca.

 

1.1.  LEGISLAÇÃO VIGENTE 

Na legislação vigente - Lei nº 9.279/96 -, temos seus conceitos preceituados no artigo 123 e incisos, in verbis: 

Artigo 123 – “Para os efeitos desta Lei, considera-se

I – marca de produto ou serviço: aquela usada para distinguir produto ou serviço de outro idêntico, semelhante ou afim, de origem diversa;

II – marca de identificação: aquela usada para atestar a conformidade de um produto ou serviço com determinadas normas ou especificações técnicas, notadamente quanto à quantidade, natureza, material utilizado e metodologia empregada; e 

III – marca coletiva, aquela usada para identificar produtos ou serviços provindos de membros de uma determinada entidade”. 

Devendo, a marca, ser registrada junto ao Órgão Competente que neste caso será o INPI (Instituto Nacional da Propriedade Nacional), com base no artigo 122, da Lei nº 9.279, in verbis: 

“São suscetíveis de registro como marca os sinais distintivos visualmente perceptíveis, não compreendidos nas proibições legais”. 

Em relação ao registro de símbolos a desobrigação contida no artigo 87, da Lei nº 9.615/98 – que veremos com mais profundidade posteriormente – é totalmente desnecessária, visto que a Lei de Propriedade Industrial traz em seu artigo 124, I, a proibição quanto a registrar símbolos como marca: 

Artigo 124 – “Não são registráveis como marca: 

I – brasão, armas, medalha, bandeira, emblema, distintivo e monumento oficiais, públicos, nacionais, estrangeiros ou internacionais, bem como a respectiva designação, figura ou imitação;”

 

 

2.     DO CLUBE EMPRESA

 

Com o advento da Lei nº 9.615, de 24 de março de 1.998, que institui normas gerais sobre desporto[9], mais conhecida como “Lei Pelé”, tornou-se necessário os clubes desportivos brasileiros - agora chamados de “entidades de prática desportiva” - se constituírem em sociedades comerciais, conforme o disposto no artigo 27 e seus incisos, da Lei supra, in verbis

“Art. 27 – As atividades relacionadas a competições de atletas profissionais são privativas de: 

I – sociedades civis de fins econômicos; 

II – sociedades comerciais admitidas na legislação em vigor; 

III – entidades de prática desportiva que constituírem sociedade comercial para administração das atividades de que trata este artigo”. 

Sendo que caso seja formada uma sociedade comercial, há opção entre serem sociedades anônimas ou sociedades por quotas de responsabilidade limitada. 

Entretanto, com a adoção da Medida Provisória nº 39, de 14 de junho de 2002[10], que altera a Lei nº 9.615/98, as entidades de práticas desportivas foram coagidas a se transformarem em empresas; sendo que o dispositivo legal passou a vigorar com o seguinte texto: 

Art. 27. Em face do caráter eminentemente empresarial da gestão e exploração do desporto profissional, as entidades de prática desportiva participantes de competições profissionais e as ligas em que se organizarem que não se constituírem em sociedade comercial ou não contratarem sociedade comercial para administrar suas atividades profissionais equiparam-se, para todos os fins de direito, às sociedades de fato ou irregulares, na forma da lei comercial.

 

 

3.     O PAPEL DA MARCA PARA O CLUBE 

 

Em relação aos clubes desportivos, marca e nome empresarial se confundem. De tal forma que a marca em sua totalidade é o nome dos próprios clubes, ou seja, seu nome empresarial; como por exemplo: Santos Futebol Clube, Clube de Regatas Flamengo, entre outros. 

Todos nós sabemos que os clubes desportivos em todo mundo comercializam produtos, como camisetas, bandeiras, bonés, flâmulas, isqueiros, bebidas alcoólicas, etc com seus nomes impressos neles, ou seja, sua marca. 

Isto certamente atrai grande clientela, como torcedores, simpatizantes e colecionadores; além de ser uma garantia de captação de recursos adicionais de receita. Fazendo de sua marca um distintivo para identificar e distinguir o seu produto dos demais, idênticos ou semelhantes. 

O que não é exclusividade destes tipos de empresa; ocorrendo o mesmo, nos demais ramos de atividade. 

Por isso se fez obrigatório o registro da marca junto ao INPI, como dito anteriormente. 

 

4. REGISTRO DA MARCA: É NECESSÁRIO? 

A priori, não é obrigatório o registro da marca. Entretanto, se o possuir pretende comercia-la e haver algum respaldo legal se faz necessário o seu registro. Caso contrário, poderá sofrer várias conseqüências, como por exemplo, o desvio de clientela. 

A pesar disto, a “Lei Pelé” em seu artigo 87 desobriga as entidades de administração do desporto (as federações, confederações e ligas desportivas) ou de prática desportiva (os clubes desportivos), a efetuarem o registro de sua denominação junto ao órgão competente. Vejamos: 

Artigo 87 - “A denominação e os símbolos de entidade de administração do desporto ou prática desportiva, bem como o nome ou apelido desportivo do atleta profissional, são de propriedade exclusiva dos mesmos, contando com a proteção legal, válida para todo o território nacional, por tempo indeterminado, sem necessidade de registro ou averbação no órgão competente”. 

Parágrafo único – “A garantia legal outorgada às entidades e os atletas referidos neste artigo permite-lhes o uso comercial de sua denominação, símbolos, nomes e apelido”. 

No mesmo sentido da Lei em vigor, declara ÁLVARO MELO FILHO[11]

“O art. 87 da Lei nº 9.615/98 outorga à denominação e aos símbolos de confederações, federações e clubes a proteção legal desburocratizada, dispensando seu registro ou averbação no Instituto Nacional da Propriedade Industrial”. 

 

5.     MARCA DE ALTO RENOME 

Devemos, também, tratar da Marca de Alto Renome. Pois, a priori, poderíamos achar respaldo jurídico nestes tipos de marcas para não efetuarmos o registro da marca do clube empresa junto ao INPI. 

Sobre isto, a Lei nº 9.279/96 traz em seu artigo 125, o seguinte: 

Artigo 125 – “À marca registrada no Brasil considerada de alto renome será assegurada proteção especial, em todos os ramos de atividade”.  

Em relação à marca de alto renome existem duas correntes sobre a forma de aquisição dessa proteção perante o INPI. A primeira entende que a marca de alto renome nada mais é do que a uma reminiscência do preconizado pela Lei nº 5.772/71, em seu artigo 67, que assinala: “A marca considerada notória no Brasil, registrada nos termos e para os efeitos deste Código, terá assegurada proteção especial, em todas as classes...”[12]. 

A segunda corrente atribui à marca de alto renome o seu conhecimento absoluto, independentemente de registro e de qualquer outra formalidade porque os fatos notórios independem de prova e alto renome, conceito, boa fama, distinguibilidade se adquire pela aceitação pública e manifesta de qualquer um do povo sem a distinção de sua classe social ou do lugar onde a marca é empregada porque, na grande verdade, é a marca absoluta que ninguém em sã consciência poderá desconhecer[13]

Assim, é evidente que a marca de alto renome deve gozar de proteção especial, não dependendo de registro na jurisdição em que é reivindicada. Contudo, não se pode descuidar que o registro da marca em si, ou melhor, da marca pura e simples deverá ser requerido e conferido em sua forma nominativa, figurativa ou mista, conforme o caso. Desse modo, havendo registro junto ao INPI e sendo considerada por este órgão de alto renome, a marca tem proteção legal em todos os ramos de atividade e não somente no ramo em que foi registrada. 

Entretanto é indispensável o seu registro, como preceituado no próprio corpo legal: “À marca registrada...”. 

 

6.     MARCA NOTORIAMENTE RECONHECIDA 

A respeito da marca notoriamente reconhecida, a legislação brasileira no artigo 126 e §§, da Lei nº 9.279/96, concede proteção especial à esta espécie de marca, independente de estar previamente depositada ou registrada no Brasil, em razão de seu conhecimento notório[14]

Destarte, se uma pessoa requerer o registro de marca igual ou semelhante à outra que o requerente evidentemente não poderia desconhecer em razão de sua atividade, cujo titular seja sediado ou domiciliado em território nacional ou em país com o qual o Brasil mantenha acordo ou que assegure reciprocidade de tratamento, se a marca se destinar a distinguir produto ou serviço idêntico, semelhante ou afim, suscetível de causar confusão ou associação com aquela marca alheia, não obterá o registro da marca pretendido em razão de outra que embora não esteja registrada goza de proteção especial[15]. 

Como se vê, esta é a única forma existente de haver amparo legal a uma marca, sem que esta seja devidamente registrada. 

Cabe ressaltar, que a “Lei Pelé” não descreve a marca da entidade de administração do desporto nem da entidade de prática desportiva, como notoriamente reconhecida.  

 

7.     CONCLUSÃO 

Por fim, embora expressa a desobrigação do registro da marca do clube empresa junto ao órgão competente, conforme disposto na Lei Pelé, que trata especificamente de normas sobre o desporto, é evidente que isto não é possível. Como visto nos termos da Lei de Propriedade Industrial é obrigatório o registro da marca junto ao INPI, para que esta goze de proteção legal. Vez que não há distinção entre os clubes empresa e as demais sociedades empresariais. 

Embora tenha o artigo 87, da Lei 9.615/98 a prerrogativa de proteger os clubes desportivos de “usurpadores de marcas”, tal distinção entre os clubes empresa e as demais sociedades não pode ter nenhuma validade, nem relevância no mundo jurídico. Visto que a Lei de Propriedade Industrial – Lei nº 9.279/96 – não traz diferenciação ao definir os que são marcas registráveis, como visto anteriormente ao transcrevermos o artigo 122, da referida lei. Além do mais, se existia alguma possibilidade de haver privilégio aos clubes desportivos quanto ao registro de suas respectivas marcas, ela foi abolida com a edição da Medida Provisória nº 39, ao equiparar as entidades de práticas desportivas às sociedades comerciais para todos os fins de direito, na forma da lei comercial. 

Caso contrário poderíamos nos deparar com inúmeros absurdos legais. Haveria a possibilidade de alguém criar um clube empresa com o nome de Microsoft, por exemplo, comercializando produtos com sua marca impressa neles; e o que é pior, com amparo legal. 

 

Referências bibliográficas: 

DIREITO desportivo – 1. ed. Campinas: Editora Jurídica Mizuno, 2.000. Vários Autores. 

DOMINGUES, Douglas Gabriel. Marcas e expressões de propaganda. Rio de Janeiro: Ed. Forense, 1.984. 

MAGALHÃES, Humberto Piragibe. Dicionário Jurídico. 7. ed. Rio de Janeiro: Edições Trabalhistas, 1990. 

MARTINS, Fran. Curso de Direito Comercial. 25. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2000. 

MELO FILHO, Álvaro. Novo regime jurídico do desporto: comentários à Lei 9.615 e suas alterações.  Brasília: Ed. Brasília Jurídica, 2001. 

SILVEIRA, Newton. A propriedade Intelectual e as novas leis autorais. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 1998. 

SOARES, José Carlos Tinoco. Título. Revista dos Tribunais Fasc. Civ., São Paulo, Revista dos Tribunais, ano 86, v. 738, abr. 1.997.

 

Arquivos de Internet: 

INSTITUTO nacional de propriedade industrial. Marcas. <http://www.inpi.gov.br>. Acesso em 06 mai. 2002. 

        SENADO federal. Legislação brasileira. <http://www.senado.gov.br/legbras/>. Acesso em 22 ago 2002.



[1] Joseph Robert Terrell Alves da Silva é Professor Assistente nas Disciplinas de Direito Empresarial e Direito Marítimo em Santos/SP. e-mail: josephterrell@uol.com.br 

[2] Marcas e expressões de propaganda. Rio de Janeiro: Forense, 1.984. p.. 81.

[3] BRASIL. Lei nº 5.772, de 21 de dezembro de 1971. Institui o Código de Propriedade Industrial e dá outras      providências. Diário Oficial [da República Federativa do Brasil], Brasília, 31 dez. 1971 p. 10.897.

[4] BRASIL. Lei nº 9.279, de 14 de maio de 1996. Regula direitos e obrigações relativos a propriedade industrial. Diário Oficial [da República Federativa do Brasil], Brasília, 15 mai. 1996 p. 8.353.

[5] Marcas. In: Instituto Nacional de Propriedade Industrial, http://www.inpi.gov.br;. em 06-05-2002.

[6] Curso de Direito Comercial, p. 350.

[7] Dicionário Jurídico, p. 576.

[8] A propriedade Intelectual e as novas leis autorais,  p.16.

[9] BRASIL. Lei nº 9.615, de 24 de maio de 1998. Institui normas gerais sobre o desporto e dá outras providências. Diário Oficial [da República Federativa do Brasil], Brasília, 25 mar. 1998 p. 01.

[10] BRASIL. Medida Provisória nº 39, de 14 de junho de 2002. Altera a Lei nº 9.615, de 24 de março de 1998, que institui normas gerais sobre o desporto e dá outras providências. Diário Oficial [da República Federativa do Brasil], Brasília, 17 jun. 2002 p. 02.

[11] Novo regime jurídico do desporto: comentários à Lei 9.615 e suas alterações,  p. 227.

[12] José Carlos Tinoco Soares, Marca de Alto Renome e Marca Notoriamente Conhecida (32-40), artigo publicado na Revista dos Tribunais, v. 738, p. 32.

[13] SOARES, op. cit. pág. 33.

[14] Fran Martins, op. cit., p. 352.

[15] José Carlos Tinoco Soares, op. cit., p. 35-36.


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