Responsabilidade
internacional dos estados pelos danos ambientais
Eliane M. Octaviano Martins[1]
SOARES, Guido Fernando Silva.
Direito Internacional do Meio Ambiente: Emergência,
Obrigações e Responsabilidades. São Paulo: Editora Atlas, 2001.
O surgimento do Direito Internacional do Meio Ambiente enquadra-se em
fenomenologia jurídica recente que regulamenta as relações entre Estados no
domínio da proteção ao meio ambiente.
A temática do meio ambiente contribuiu para a globalização do Direito
Internacional, ao operar uma intrusão na esfera dos assuntos reservados à
regulamentação interna e exclusiva dos Estados.
É crescente a preocupação, no âmbito internacional, com a proteção do meio
ambiente, que influencia cada vez mais as relações econômicas internacionais,
aviltando desta forma a importância das normativas ambientais atinentes à
temática, recepcionadas no âmbito do recente Direito Internacional do Meio
Ambiente.
De fato, nos últimos 40 anos se insurge progressivamente uma normativa ambiental
internacional cada vez mais ampla que se consagra no âmbito do Direito
Internacional Contemporâneo.
Inobstante algumas iniciativas datadas do início do século XX, considera-se a
década de 60 como o marco do surgimento do Direito Internacional do Meio
Ambiente.
De natureza funcional, interdisciplinar e globalizante, o Direito Internacional
do Meio Ambiente rechaça fronteiras jurídico-políticas dos Estados impondo
conformidade de normas internas com as exigências internacionais.
A obra Direito Internacional do meio ambiente: Emergência, Obrigações e
Responsabilidades (São Paulo: Editora Atlas, 2001), de autoria do Prof. Dr.
Guido Fernando Silva Soares, veio preencher uma lacuna na literatura
especializada brasileira. Destaca aspectos jurídicos e políticos do meio
ambiente, configurando um estudo sistemático de todos os campos da
regulamentação ambiental pelos Estados em nível internacional.
O autor é bacharel em Ciências Jurídicas e Sociais pela Faculdade de Direito da
USP, mestre em Direito Comparado (Master in Comparative Law) pela Law School da
Universidade Illinois (EUA) e doutor em Política Internacional pela Pontifícia
Universidade Católica de São Paulo - PUC-SP. Professor titular de Direito
Internacional Público da Faculdade de Direito da USP e presidente da Sociedade
Brasileira de Direito Internacional do Meio Ambiente.
Dividida em treze capítulos, a obra traça primorosa abordagem de vários tópicos
de extrema importância relacionados à temática. É exposta numa linguagem
acessível e objetiva, revestida de caráter didático-pedagógico e amparada em
abrangente pesquisa bibliográfica.
A obra tem como principal objetivo traçar uma abordagem dinâmica e atualizada os
temas da emergência do Direito Internacional do Meio Ambiente, seus antecedentes
históricos e as primeiras normas internacionais sobre o assunto, as obrigações e
responsabilidades que engendra.
Analisa ademais grandes realizações conjuntas dos Estados, como a Conferência da
ONU sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, a ECO-92, e as fontes do Direito
Internacional do Meio Ambiente, tratados multilaterais e a jurisprudência
internacional.
Merece destaque diversas abordagens atinentes aos tratados e convenções
internacionais relativos a proteção do meio ambiente. Para o autor, proteger
significa “determinar as condutas que preservam o equilíbrio do meio ambiente,
em detrimento de outras, consideradas ilícitas ou proibidas, e portanto,
acompanhadas de uma sanção, caso sejam praticadas”.
Revela ainda a distinção entre os tratados-quadros e os umbrella treaties.
Os umbrella treaties são tratados amplos que deverão – a exemplo de um
guarda-chuva – abrigar outros atos internacionais menos solenes e firmados em
complementação, i.e., destaca a continuidade de continuidade dos procedimentos
de negociação sem que haja necessidade de solenidades que cercaram a adoção do
umbrella treaties. Destaca, dentre outras, a seguintes diferenças entre
tratados-quadros e umbrella treaties: nos tratados-quadros existe a
instituição de órgãos legisladores, com delegação de função aos Estados de
complementar o tratado, nos umbrella treaties a atividade legisladora é
autônoma e é delagada aos estados.
Insta destacar ademais a abordagem de questões atinentes a desastres ecológicos
e litígios internacionais, a questão da efetividade da reparação ao dano
ambiental, unicidade do meio ambiente global e desafios do direito internacional
do meio ambiente.
A última parte da obra analisa a responsabilidade internacional dos acidentes ou
desastres ambientais de grande repercussão internacional. Tais desastres,
indubitavelemente, vieram a consolidar a necessidade de elaboração normativa de
prevenção, destacando o meio ambiente uma realidade sem fronteiras.
No capítulo em questão são elididos os “leading cases” julgados nas Cortes
Internacionais e decididos por arbitragem entre Estados: Fundação Trail e Lago
Lanoux (arbitragem, 1941 e 1956 respectivamente); a maré negra causada pelo
petroleiro “Torrey Canion” (1967); acidente industrial em Seveso, Itália e o
acidente com o satélite soviético Cosmos 924 (negociação extrajudicial, 1976 e
1984, respectivamente); poluição marinha causada pelo Amoco Cadiz (resolvido
pela Corte de Illinois, EUA, 1978); acidente industrial em Bhopal, Índia (1984),
desastre radioativo na usina Chernobyl, Ucrânia, caso Sandhoz, França. Insta
destacar que os casos Torrey Cânion, Seveso e Chernobyl revelariam lacunas no
Direito Internacional e dariam causa à adoção de normas atinentes à proteção do
meio ambiente, todavia não no que concerne à regulamentação da responsabilidade
internacional.
Destaca ainda o autor a importância do estudo da responsabilidade internacional
pelos danos causados ao meio ambiente, ressaltando que, se esse é um instituto
que não regulamentará , de maneira direta, “os comportamentos de procurar-se
evitar a ocorrência de fatos danosos a pessoas e ao meio ambiente (incumbência
de outros capítulos do Direito Internacional do Meio Ambiente), pelo menos
buscará criar um sistema de reparações ex post factum, possivelmente
servindo como reforço às sanções das normas que regulam, primariamente, os
deveres dos Estados, em matéria de proteção ao meio ambiente, o qual é uma
realidade naturalmente internacional, dadas as interações entre seus elementos
componentes, tais quais existentes no mundo da Ecologia e unificados, pela
incumbência dos valores a serem preservados, na norma do Direito Internacional
do Meio ambiente”.
[1] Eliane Maria Octaviano Martins é doutoranda pelo PROLAM/USP,; sócia de Octaviano Martins Advocacia, Consultoria e Arbitragem (Santos (SP), Vice-Presidente do Instituto Paulista de Direito Comercial e da Integração – IPDCI; Professora Titular de Direito Comercial e de Direito Marítimo da Universidade Santa Cecília – UNISANTA, professora titular de Sistemática e Comércio Exterior, Prática Cambial e Direito Empresarial da UNIMONTE; Coordenadora de Redação da Revista de Direito Internacional e Mercosul (Ed. La Ley, Argentina).